DIALÉTICA, LUTA DE CLASSES, O METABOLISMO DO CAPITAL
E AS CONTRADIÇÕES DO PROCESSO SÓCIO HISTÓRICO.
Helder Molina - 2012
Desconfiai do mais trivial, na aparência singela.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural. Nada deve parecer impossível.
(BRECHT, Nada é impossível de mudar).
Tempo de balanço, laços cortados, projetos estilhaçados, identidades dilaceradas, encruzilhadas, incertezas. Como diz Carlos Drummond de Andrade, nosso tempo é um tempo partido. Mas pode ser tempo de transição, travessia, pontes, mediações, invenção do novo.
A luta de classes é uma arena de possibilidades contraditórias. Aprendemos que somente é possível fazer mudança social quando os “de baixo” se organizam e pressionam por transformações radicais. Portanto, o palco das mudanças e das transformações numa ordem desigual e autoritária como a nossa são as ruas. Não haverá mudanças, se não se criar uma consciência coletiva solidária, socialista e militante, entre os lutadores do povo.
Não basta apenas aos “de baixo” se organizarem. Em cada luta devem-se extrair as lições necessárias para que os trabalhadores não sejam capturados pelas artimanhas dos “de cima”. Para isso, é preciso a compreensão histórica da necessidade de os trabalhadores desenvolverem uma estratégia para a superação do capitalismo e a construção de uma sociedade socialista, do nível de consciência política do povo em cada momento histórico, mas também procurar fazer de cada luta um acúmulo de forças que vise fundamentalmente à transformação radical. Radical sim, no sentido de ir-se à raiz dos problemas, sabendo que somente a construção de uma sociedade de homens livres e associados poderá levar à real emancipação humana.
O tempo, o contexto, e o trabalho militante
A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar. (EDUARDO GALEANO, A utopia).
Nossa atividade prática e reflexão teórica se referenciam na inquietante provocação feita por Florestan Fernandes sobre o papel dos intelectuais engajados e militantes, cuja ação busca realizar três deveres: Não se deixar cooptar; não se deixar liquidar: Garantir vitórias para o povo.
Uma pesquisa, estudo, tese, que analise concretamente a atualidade, deve ‘ir além’, da formalidade, princípios e métodos interpretativos. Um outro de seus legados é a resistência revolucionária. O papel do pensamento crítico e militante é combater o recuo ideológico, seja tático e estratégico, quando parece ser norma a concessão à ideologia burguesa, há que se erguerem vozes indômitas, para retomar as bases do da luta anticapitalista, denunciando o adesismo, resistindo ao colaboracionismo, e também ao pretenso evolucionismo defendido pelos pensamento e prática esquerdista, movidas pelo fetichismo das concepções dogmáticas ou mágicas, de que a humanidade caminha numa marcha inelutável do capitalismo para o socialismo.
Florestan Fernandes (1995), num de seus mais combativos e lúcidos textos – Revolução, um fantasma que não foi esconjurado - alertava que se sobrevivem as crises de longa duração, e se persiste o clamor rancoroso dos que sofrem os dilemas sociais, a ordem econômica, social e política está condenada. Generaliza-se o saber de que na civilização vigente fica a gênese das iniquidades, das psicoses, e do padrão de desumanização do ser humano.
As duas alternativas são a decadência capitalista e a barbárie civilizatória, ou escrever a história a contra pelo, na perspectiva do socialismo. De que lado nos situamos? Deixar que a civilização mais rica da humanidade pereça miseravelmente ou levar avante os processos de renovação sem limites que ela contém, sob a égide do socialismo revolucionário?
Uma indagação nos move nos últimos anos. Os sindicatos estão em crise? Por todos os lados se fala da crise, das mudanças dos paradigmas sindicais, do desmonte da identidade originária do sindicalismo, enfim, da paradoxal encruzilhada histórica quem estes enfrentam. São vozes pertinentes à esquerda, discursos eloquentes à direita, nos meios acadêmicos, nas mídias hegemônicas, nos movimentos populares, nos próprios sindicatos, entre os próprios militantes.
A percepção da crise aparece sistematicamente nas análises sobre os sindicatos, no Brasil e no mundo. Este é um terreno de dissenso. Existem profundas divergências de interpretação quanto aos efeitos, impactos, e principalmente sobre os desdobramentos presentes e futuros de tal crise, e sobre quais as alternativas.
Há um razoável acordo entre a academia e o mundo sindical na constatação de que ele enfrenta enormes problemas e dificuldades, que exigem reflexão sobre a sua orientação político-ideológica, ação, organização-forma de intervenção e perspectivas tático-estratégicas, fruto das alterações radicais na composição e estratificação da sua base social, provocadas pela radical mudança no processo produtivo. Essa crise se relaciona com a enorme ofensiva desregulamentadora, para eliminar ou enfraquecer os direitos históricos dos trabalhadores.
Em tempos de crise, a arena da luta de classes é ocupada por múltiplos sujeitos sócio históricos e, em tempo das grandes crises históricas, surgem novos atores que tornam ainda mais complexo o mosaico político. Por isso, é necessária a análise das relações de força entre os diversos grupos sociais em disputa pela hegemonia, pois somente através dela seremos capazes de determinar teoricamente quais serão as saídas operadas para uma crise orgânica.
As classes sociais, os grupos, os diferentes atores políticos estão em relação uns com os outros. Essas relações podem ser de confronto, de coexistência, de coooperação e estarão sempre revelando uma disputa de forças, de domínio, igualdade ou de subordinação. As ações da trama social e política se desenvolvem em determinados espaços que podem se considerados como cenários. O cenário de um conflito pode se deslocar de acordo com o desenvolvimento da luta. Passar das ruas e praças para o parlamento, daí para os gabinetes ministeriais e daí para os bastidores.
Cada cenário apresenta particularidades que influenciam o desenvolvimento da luta e muitas vezes o simples fato de mudar de cenário já é uma indicação importante de uma mudança no processo. A capacidade de definir os cenários onde as lutas vão se dar é um fator de vantagem importante.
No atual cenário, ou contexto sócio-histórico há, claramente, uma crise de hegemonia do capital, que vamos discutir neste trabalho. Aprendemos com Antonio Gramsci, que na crise de hegemonia, as ideologias dominantes perdem força e os laços existentes entre dominantes e dominados, entre governantes e governados, vão se enfraquecendo. Os aparelhos privados de hegemonia, operados pelos intelectuais orgânicos e tradicionais das classes dominantes, já não conseguem soldar o bloco histórico em torno da concepção de mundo burguesa, destruindo as ligações entre a superestrutura e a estrutura, na qual a classe trabalhadora não se sente mais representada pelos interesses das classes dominantes. (CHAUI, 2000).
Concordando com Chaui (2000), nesses cenários, o consenso vai, paulatinamente, se dissolvendo e a agitação das classes subalternas cresce na medida exata desta dissolução. Na crise de hegemonia, tais classes deixam de acreditar na capacidade dirigente dos governantes, que se mostram incapazes de solucionar os aspectos mais deletérios da crise sobre a sociedade como um todo.
Gramsci identifica essa crise de hegemonia, isto é, de direção, quando.
A classe dominante perde o consenso, ou seja, não é mais ‘dirigente’, mas unicamente ‘dominante’, detentora da pura força coercitiva, isto significa exatamente que as grandes massas se destacaram das ideologias tradicionais, não acreditam mais no que antes acreditavam etc. A crise consiste justamente no fato de que o velho morre e o novo não pode nascer: neste interregno, verificam-se os fenômenos patológicos mais variados (2002a, p. 184).
O presente trabalho se construiu nesse terreno histórico de encruzilhada, de crise de hegemonia do capital, esgotamento do velho, e do desafio diante do novo ainda em processo de gestação, o contraditório terreno da história, atentos à alerta de Marx, pois.
Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como bem entendem; não a fazem sob circunstâncias que escolhem por si mesmos, mas sob circunstâncias já existentes, dadas e transmitidas desde o passado. A tradição de todas as gerações mortas pesa como um pesadelo sobre os cérebros dos vivos. E, tão logo se acham ocupados revolucionando-se a si mesmos e às coisas, criando algo que não existia antes, precisamente nessas épocas de crises revolucionárias eles conjuram ansiosamente os espíritos do passado para pô-los a seu serviço, deles obtendo nomes, gritos de guerra e roupagens a fim de apresentar essa nova cena na história do mundo num disfarce de coisa abalizada pelo tempo e numa linguagem emprestada. (MARX, 1978, p.17).
Assim, o objeto desta pesquisa consiste em analisar e compreender as mediações e contradições que fundaram as bases político-ideológicas do chamado novo sindicalismo e da CUT (1982/1983), no contexto da transição da ditadura civil militar para a nova reconfiguração política e jurídica do estado democrático burguês. Novo sindicalismo este, que na nossa concepção, operou uma transformação nos fundamentos de sua ideologia e projeto político, pressionados pela hegemonia burguesa e sua nova sociabilidade, nas duas últimas décadas (1990/2011).
Para nós, o conhecimento é uma mediação que nos remete à práxis, isto é, à ação concreta na realidade, que para se aprofundar de maneira mais consequente, precisa de reflexão, do autoquestionamento, da teoria que nos remete à ação, que enfrenta seus acertos e desacertos, cotejando-os com a prática,
Parafraseando Galeano (2005), pode-se dizer que somos produzidos e produzimos o que somos através da práxis. Somos o que fazemos, e, sobretudo aquilo que fazemos para mudar o que somos. Nossa identidade reside na ação e na luta. Por isso, a revelação do que somos implica dialeticamente na denúncia daquilo que nos impede de ser o que podemos ser.
Mediações e contradições estas, que se reconfiguraram, ao longo dos últimos trinta anos, principalmente no período histórico de reestruturação e metamorfose da hegemonia capitalista. Confronta-las com as determinações e condicionantes engendradas pela violenta e profunda hegemonia das políticas e ideologias neoliberais no Brasil e no mundo, buscando verificar se houve uma adaptação, ou resistência a essa hegemonia da ordem capitalista, que impactaram o mundo do trabalho e os sindicatos.
Somos sujeitos históricos, a construção de nossa consciência é resultado de processos sócio-políticos e interações ético-culturais. Produzimos e somos produzidos historicamente. A escolha de um objeto de estudo é resultado de fatores objetivos, colocados pelas necessidades, interesses e demandas acadêmicas e profissionais, mas, sobretudo, pelas motivações subjetivas, construídas a partir das experiências vividas e das tomadas de posições ético-políticas diante da realidade que nos cerca.
Um estudo acadêmico, para aqueles que lutam pela igualdade social e emancipação humana, deve contribuir para transformar concretamente as condições de vida dos trabalhadores somar esforços para sua luta emancipatória enquanto classe. Na nossa trajetória, como na história da classe trabalhadora, nas diversas derrotas e fracassos, e tantas vitórias, sempre esteve presente, embora muitas vezes inconsciente, a advertência de Marx,
A escolha deste tema vincula-se à nossa trajetória de vida, cuja identidade é o movimento sindical, no qual temos referência, militância política, atividade profissional. Trabalhamos há de 24 anos no movimento sindical e outros movimentos sociais com formação política, assessoria, consultoria de formação e planejamento.
Esta análise tem no materialismo histórico e dialético os referenciais teóricos, clássicos e contemporâneos, posto que buscam compreender o papel histórico e imediato dos sindicatos e do movimento sindica. Deste modo vamos contextualizando-os sócio-historicamente em suas contradições e mediando permanentemente as possibilidades e limites, como instrumento de classe na luta pela construção de um projeto societário de transformação econômica, social e política, na perspectiva da emancipação humana e social, de caráter socialista e democrático.
Discutimos, também, as alternativas, tarefas e desafios com que se defrontam os sindicatos e ao movimento sindical, como afirmamos anteriormente, diante da atual crise de hegemonia e das metamorfoses sócio-metabólicas do modo de produção capitalista e da complexidade da luta de classes no tempo presente.
Ao longo de anos de militância política, ideologicamente vinculadas ao campo do marxismo, enfrentando os dilemas e contradições próprias da luta de classes, e coerentes com nosso referencial teórico-político. Num esforço intelectual de buscar compreender os processos, determinantes e condicionantes históricos, políticos e ideológicos sobre a realidade do mundo material em que estamos inseridos.
Doutor em Políticas Públicas e Formação Humana (UERJ); Mestre em Educação (UFF); Licenciado e Bacharel em História (UFF). Trabalho com Assessoria Sindical; Formação Política; Produção de Conteúdos; Planejamento; Gestão; Elaboração e Produção de Cadernos de Formação, Apostilas, Conteúdos Didáticos; Produção e Execução de Cursos, Seminários, Palestras, Aulas, Oficinas; Produção de Projetos Sindicais, professorheldermolina@gmail.com - 21 997694933,Facebook: Helder Molina Molina
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