segunda-feira, 29 de junho de 2015

TRABALHO, PRÁXIS, E FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE

TRABALHO, PRÁXIS, E FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE
Por Helder Molina
A história do movimento sindical e da instituição sindicato, e dos partidos operários, se produzem e se confundem com a história do modo de produção e da sociabilidade capitalista. As lutas e os sindicatos surgem como resposta a exploração e dominação dos capitalistas, na violência de classe que estes impuseram aos trabalhadores no processo da revolução industrial, até os nossos dias.
Ao o produzirem as condições para viver, os homens e mulheres constroem as relações sociais, criam as formas de organização dessas relações e alimentam as possibilidades de conservar e ou transformar a vida social existente. Historicamente existem diferentes formas de produzir e reproduzir a vida social. Vivemos em uma forma específica de produzir a vida em sociedade, o capitalismo.
Na formação social capitalista, o trabalho foi transformado em mercadoria. Ou seja, os trabalhadores para sobreviver, trocam a sua capacidade de trabalho por salário. E este, é transformado em mercadorias que representam parte das condições das quais os trabalhadores poderão satisfazer as suas necessidades básicas (e outras tantas), e a variedade de mercadorias criadas pelas mãos humanas parece ter chegado a números quase incalculáveis.
O trabalhador, sujeito fundamental da produção da riqueza social é submetido a um processo progressivo de empobrecimento, e pressionado a incorporar na sua formação, informações que em nada asseguram seu ingresso no mercado de trabalho ou ainda, sua permanência neste.
Assim, é impossível e inaceitável confundir essa força com quaisquer outros meios existente de se executar tarefas, ainda que os capitalistas insistam em tratar o cavalo, o tear mecânico, o vapor, o motor a combustão, a energia elétrica, o telefone e a força humana como equivalentes, pois a eles o que interessa é apenas o resultado da produção, ou seja, o aumento de suas taxas de lucros.
O trabalho, em sua forma original, passou por séculos de metamorfoses – das formas primitivas de relação com a natureza e de atuação sobre ela como imperativo de sobrevivência, ao artesanato e agricultura, até as corporações de ofício da Idade Média e da transição para a Idade Moderna, aos modernos sistemas industriais de fábricas -, atingindo o complexo sistema de exploração que hoje conhecemos.
Com efeito, ao final do século XX, a humanidade experimentou um extraordinário avanço científico e tecnológico e, sob a hegemonia do capital, houve mais destruição do que bem estar. As contradições provocadas pela sua mundialização (Chesnais, 1998), atingem o conjunto da humanidade.
A nova base técnica do trabalho, produto da extraordinária revolução eletrônica, produz robôs, máquinas informatizadas que, como nunca, podem aumentar a produtividade e a qualidade da produção, prescindindo de milhões de cérebros e braços, ao mesmo tempo em que ampliam a exploração e a precarização dos trabalhadores empregados e produzem um contingente absurdo de desempregados.
Os processos de trabalho, nos diferentes ramos da economia, têm sido incessantemente metamorfoseados, buscando sempre uma maior acumulação de capital. Para o trabalhador, que vende sua força de trabalho, essas transformações nunca representaram algum tipo de melhoria ou ganho duradouro e significativo.
Pelo contrário, para ele, submetido à lógica de acumulação e exploração do capital, o trabalho está associado a sofrimento e dor, (como no caso da aluna trabalhadora, citado no início deste capítulo, que identifica trabalho com alienação e fardo) porque o trabalhador não é capaz de decidir sobre aquilo que faz nem sobre o destino das mercadorias e valores que produz. O fruto do seu esforço é apropriado por outra pessoa, é apropriado pelo dono da empresa, pelo proprietário dos meios de produção.
O ser humano, em sua existência material, o tempo todo cria necessidades e cria meios para satisfazê-las. Essas necessidades podem ter conteúdos humanizadores, de emancipação do corpo e expansão espiritual. Ou o seu contrário, desumanizadoras, como é própria do consumismo capitalista e do fetichismo da mercadoria.
Isso não significa dizer que não haja limites, de várias ordens, na dilatação de determinados meios que respondem a necessidades historicamente criadas. O trabalho dedicado a satisfazer aquelas necessidades humano não pode se limitar a uma quantidade e a uma forma historicamente dadas.
No entanto, no modo de produção capitalista não é do trabalho livre, emancipado e emancipador que estamos tratando, mas de um trabalho obrigatório, alienado, de um trabalho abstrato. Subsumido ao capital, o trabalho se converteu em um meio de criar riquezas em geral, deixando de estar vinculado aos indivíduos como determinação dentro de uma particularidade. O modo de existência quantitativo do trabalho e o tempo de trabalho uniforme e diferenciado, simples, por assim dizer, despido de toda qualidade.
Sob o regime do capital, o trabalho alienado, a divisão do trabalho, a lei do mercado e a propriedade privada formam uma cadeia que aprisiona e embrutece quem o produz. Não se pode escapar da alienação da relação salarial sem propor e lutar, ao mesmo tempo, pela apropriação social, planificação democrática e solidária da economia e a substituição da divisão do trabalho pelo trabalho livre, associado e emancipado. Em suma, lutar contra o próprio capital e o capitalismo.
O trabalho em sua forma capital, e o sistema de capital, o capitalismo, produziu um paradoxo. Numa sociedade de superprodução e de produção do supérfluo, por um lado os seres humanos buscam responder às suas necessidades básicas, socioculturais e ético-políticas e estéticas com um tempo de trabalho produtivo cada vez menor, e por outro, a incapacidade do capital de socializar e democratizar essa produção e de gerar efetivamente tempo livre, de liberdade, de emancipação do corpo e de expansão espírito, de expressão de seus talentos e aptidões criativas.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

O EDUCADOR E SEU OFÍCIO ÉTICO POLÍTICO


Helder Molina (Junho de 2015)
Adoro ser professor, educador, minha identidade humana, política, e profissional. Atualmente trabalho com 4 turmas de graduação, na Faculdade de Educação, aqui na UERJ. Todas com mais de 95% de mulheres. São meninas, jovens e senhoras, e poucos homens, uns 5, entre quase 150 mulheres.
Trabalho com responsabilidade, compromisso ético político, com posições assumidas, não sou neutro, tenho lado, sou da classe trabalhadora, e olho o mundo com os olhos de nossa classe. Sei que o que digo, penso, e faço, tem consequências e peso nas atitudes e formação (ou mudança) de valores e concepções delas. Nosso trabalho se soma para emancipar essa classe e transformar as injustas estruturas e realidades econômico-sociais, e político-culturais.
Elas, minhas alunas, madrugam, acordam 4:30, 5:00, 5:30, pegam dois meios de transportes, chegam sonolentas, mas eu as acordo, e as animo, e me animo, todas as aulas.
Estudar é difícil, mas fundamental e necessário. Há momentos, nelas e em mim, de ceticismo, perplexidade, dúvidas, impotência até, diante das coisas, mas há que ser desafiar o futuro, produzir a vida, mudar o que se apresenta diante de nós. São trabalhadoras, mães ou filhas de trabalhadores(as) muitas com três jornadas diárias, em casa, no trabalho, e nos estudos. Com força e com vontade.
Sou pulso, pulsão e impulso, mas maturidade e a serenidade vão chegando, ficando raízes. Vivo de semeadura. Derramando sementes em tantos terrenos, áridos e férteis.
A gente vai amadurecendo, e as sementes que semeamos ao longo da vida, nos tantos caminhos por onde andamos por essa vida afora, vão nascendo, brotando, crescendo, e agora dão frutos. Maturidade afetiva e familiar, que sustentam e dão sentido a essa caminhada.
Maturidade acadêmica, doutorado, concurso, carreira, estabilidade, docência, pesquisa, orientações. Amo ser professor, educador, e assim ser identificado. Mas sem abandonar minhas origens, a seiva donde me alimento, que são os movimentos sociais, a luta de classes, a militância política, particularmente os sindicatos, onde tenho trabalhado, nestes quase 25 anos, com assessoria, formação política e humana, planejamento, gestão, projetos, cursos, enfim. e com quem tenho interlocução, vínculos, identidade, relações construídas, tanto profissional, quanto política e ideológica
Helder Molina (Junho de 2015)

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Estado de sítio e higiene social: A criminalização e a memorização da punição penal

Estado de sítio e higiene social:
A criminalização e a memorização da punição penal

Helder Molina

O capitalismo, desde a revolução industrial inglesa, nasceu oprimindo nas fábricas crianças e jovens de uma maneira geral, até a exaustão. Paralelamente, constrói toda uma estrutura repressiva baseada em orfanatos, reformatórios, etc. Para a infância e a juventude pobre e privada de tudo, assim como para os proletários adultos, são duas as suas “opções”: exploração desumana do trabalho ou o encarceramento.


No Brasil, o encarceramento de crianças e adolescentes é proibido no papel. A Constituição estabelece que são criminalmente inimputáveis pessoas com idade inferior a dezoito anos. No entanto, a imputabilidade existe, e em condições por vezes mais perversas que as vigentes em prisões de adultos. O povo conhece bem a violência e a perversidade que expressa a sigla Febem, a famigerada Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor.
A opinião favorável à extinção da Febem é praticamente unânime entre profissionais da área. A psicóloga Carmen Oliveira, professora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), construiu sua biografia na luta contra o confinamento de deficientes mentais em manicômios. Carmen foi presidente da Febem/RS em 1999 e afirma que o modelo de internação tampouco é adequado a crianças e adolescentes. Para ela, "uma boa Febem é aquela que seria efetivamente uma "UTI" para adolescentes com maior agravamento de sua inserção no delito e não como tem sido hoje, uma porta de entrada".
Gladys Romeo Peccequillo foi a funcionária que, em 2002, denunciou alguns dos aspectos mais sórdidos da Febem de São Paulo, como torturas e espancamentos sistemáticos. As denúncias custaram-lhe o emprego. Em entrevista concedida ao Centro de Mídia Independente em maio de 2003, ela afirma de maneira categórica: "a Febem não tem reforma".
— Em 1999 — lembra — fecharam a unidade da Imigrantes, onde houve uma grande rebelião. Apareceu então Parelheiros, que passou a levar a fama de ser a pior unidade. Fecharam Parelheiros, e apareceu Franco da Rocha.
NAS GARRAS DO FASCISMO
Em 2003, uma investigação da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados resultou no relatório O sistema Febem e a produção do mal. O relatório, redigido pelo ex-deputado Marcos Rolim, identificou um quadro de violação sistemática dos direitos de crianças e adolescentes confinados nestas unidades em todo o país.
A Febem paulista é de longe a pior. Em seu relatório, Rolim afirma que a unidade de Franco da Rocha nada mais é que "um conjunto de presídios para adolescentes" e "um monumento à ilegalidade". Isto porque, a exemplo do que ocorre com os presídios para adultos (AND 27), sua própria concepção é ilegal.
O Estatuto da Criança e do Adolescente — ECA — estabelece condições para a internação com: separação por idade, compleição física e gravidade da infração; obrigatoriedade de atividades culturais e esportivas, profissionalização e escolarização; atendimento personalizado, em pequenas unidades e grupos reduzidos; e instalações em condições adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança, entre várias outras.
A rigor, as unidades das Febens, Brasil a fora, não oferecem nada disso, mesmo porque, em geral, estão organizadas em antigos presídios desativados e reaproveitados. Mas a unidade da Febem paulista em Franco da Rocha é diferente precisamente por isto: porque foi projetada já na vigência do ECA para ser um campo de concentração.
Por causa disto, em 2002, a prefeitura de São Paulo recusou-se a autorizar sua instalação, o que levou o governo a transferi-la para o município vizinho. O Ministério Público conseguiu suspender liminarmente a construção, mas o Tribunal de Justiça do estado (TJ-SP), mantendo a tradição de decisões favoráveis à Febem, cassou a medida.
A orientação abertamente fascista do TJ tem sido, aliás, fundamental para a manutenção deste estado de coisas. "Em São Paulo, trata-se com extraordinária naturalidade o hábito de encarcerar meninos desde os 12 anos" — constata o relatório da Câmara.
— É que, em solo intolerante para com a criminalidade violenta e cioso dos direitos humanos do cidadão — justifica a Câmara Especial do Tribunal no julgamento do habeas corpus 115.133-0, em 6 de dezembro de 2004, reproduzindo parecer do Ministério Público -, ensina-se que, como até mesmo o mero bom senso já seria capaz de propor, não pode o Estado permitir-se a insanidade de autorizar que se veja livre e sem amarras quem, pela prática de infração penal grave, revelou possuir perigosa propensão criminal, assim como não admitiria que um animal predador selvagem se aventurasse pelas ruas da cidade (o negrito é do original).
No processo em que foi proferida esta aberração, discutia-se o pedido de um adolescente de dezesseis anos para esperar em liberdade o julgamento de um recurso relativo a uma condenação por ato equiparado a tráfico de entorpecentes.
ESTRATÉGIA: CRIMINALIZAÇÃO
O ECA diz claramente que a internação só pode ser aplicada a crimes violentos. Mas na prática, qualquer ato infracional tem como resultado a internação. Se o Judiciário respeitasse o ECA, mais da metade dos adolescentes recolhidos à Febem em São Paulo estariam cumprindo outro tipo de medida sócio-educativa. Pelo menos é o que revela uma pesquisa do Instituto das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente (Ilanud): de uma amostra de 2.100 adolescentes acusados entre 2000 e 2001, apenas 1,6% havia cometido alguma espécie de crime contra a vida; uma proporção razoável era (apenas) acusada de roubo e mais da metade estava na Febem por furtos, muitas vezes irrisórios.
Trocado em miúdos, as autoridades não cumprem a lei. Nem mesmo o frágil ECA. Pior, colocam-se contra ela. Rangem os dentes, sempre quando o povo pobre e oprimido invoca uma lei em sua defesa e fazem a apologia da repressão pela repressão — flagrante e descaradamente, a ponto de serem denunciadas pela sua própria imprensa.
Para piorar, lembra Antonio Mafesoli, do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Condepe), em entrevista à revista Fórum de julho de 2005, "existe um absurdo que só acontece em São Paulo. Muitos juízes consideram que a confissão dispensa a prova e seguem sentenças modelo, do tipo: um adolescente com uma arma, tantos meses, dois adolescentes desarmados, tantos meses".
Esta situação não decorre, como frequentemente se supõe, da negligência pura e simples do Estado em relação à infância e juventude pobres. Ao contrário, elas são plenamente "atendidas". A questão é como.
Basta ver alguns números mencionados por Carmen Oliveira:
— Nos últmos 3 anos — diz a professora — temos 30% mais internos no Brasil. Se um adolescente custa em média 4 mil reais mensais na privação de liberdade, cerca de 70 internos do munícipio de São Leopoldo na FASE (sucessora da Febem no Rio Grande do Sul) custariam mensalmente 280 mil reais. Ora, porque não inverter a prioridade e construir políticas públicas locais dirigidas à infância e adolescência com estes mesmos 280 mil mensais?
Como denunciou a professora Vera Malagutti, em AND 22, o que ocorre é que a população que deixa de ser atendida pelo Estado previdenciário e passa à seara do Estado penal.
IDADE PENAL
Isto fica claro na principal reivindicação de determinados setores com poder de intervenção repressiva controlados pelos fascistas: o rebaixamento da maioridade penal para 14 ou 16 anos. Busca-se ampliar o público-alvo da legislação penal criminalizando-se adolescentes.
— A bandeira punitiva, como a do rebaixamento penal, é, antes de tudo, absolutamente improcedente até do ponto de vista técnico — diz Carmen Oliveira.
De acordo com o relatório de Marcos Rolim, "as proposições que pretendem a redução da idade penal nos oferecem a visão de uma viagem no tempo. É em direção ao passado que elas nos orientam. Afinal, o sistema de criminalização de adolescentes caracterizou a doutrina penal do século XIX com o Código Criminal do Império que, promulgado em 1830, somente impedia a responsabilização criminal dos menores de 14 anos. Pior do que isso, o primeiro Código Penal da República, editado em 1890, só não considerava criminosos "os menores de 9 anos completos" (!) ou aqueles que sendo maiores de 9 e menores de 14 houvessem agido sem discernimento. Nenhuma dessas experiências, aqui no Brasil ou em qualquer outro país, foi capaz de afirmar um caminho para a redução da violência juvenil ou para a reinserção social dos infratores."
"São muitos — prossegue o relatório da Câmara — os estudos que associam o rigor penal à industrialização da própria violência".
É espantoso porque o objetivo não é reduzir a violência, mas ampliar seu exercício pelo Estado contra a população pobre. Uma das iniciativas mais tétricas neste sentido é uma circular distribuída em escolas estaduais de São Paulo pela Secretaria de Educação e pelo Ministério Público estadual orientando diretores a encaminhar à polícia e à Justiça — para posterior envio à Febem — alunos que cometam atos como dirigir-se aos professores com palavrões ou quebrar vidraças...
— Temos de distinguir atos de incivilidade daqueles nitidamente enquadrados como delitos — argumenta Carmen.
— No caso de palavrões sequer podemos dizer que se tratam de atos infracionais. É falta de educação, mesmo, e jamais caso de polícia. Quebrar uma vidraça da escola pode ser enquadrado como um delito contra o patrimônio mas penso que isto deve ter um encaminhamento restaurativo e pedagógico pelos professores e não policial. A punição seria a mesma em se tratando de escolas privadas e com crianças e adolescentes de maior poder aquisitivo? — questiona.
Ela própria responde:
— Acho que não! Concordo com Wacquant, quando fala que há uma tendência à criminalização da pobreza. Isto é inegável por que constata ao mais breve exame o corte de classe e racial no sistema penal e socioeducativo brasileiro...
ENTULHO MENORISTA
O ECA surge em decorrência do artigo 227 da Constituição, que estabelece a chamada doutrina da proteção integral. No entanto, o refluxo posterior do processo de mobilização social que resultou na vitória parcial das forças progressistas na Assembléia Constituinte, após o fim do gerenciamento militar, acabou por limitar muito o potencial transformador do Estatuto.
Datam da colônia a responsabilização criminal de adolescentes e as primeiras instituições de recolhimento de crianças ou adolescentes órfãos e abandonados, as chamadas Casas de Expostos. Com algumas modificações, o essencial desta concepção prevaleceu ao longo dos séculos. Houve um tênue progresso com o Código de Menores de 1927, conhecido como Código Mello Mattos. Progresso, no entanto, revertido em parte pelo famigerado Código de Menores de 1979. Este, apesar de um ou outro floreio retórico destinado a mascarar a continuidade e agravamento da concepção vigente, representou, para Cristina Lazzarotto, da Unisinos, um "retrocesso de mais de 50 anos, pois colocou o menor em situação pior que a do criminoso adulto, instituindo a prisão provisória para o menor, a qual poderia ser decretada sem a presença do curador de menores." (!)
Tanto o Código de 1927 quanto o de 1979 são expressões do que se convencionou chamar de menorismo. Têm como pressuposto a tutela das crianças e adolescentes, não o seu desenvolvimento. Afinal, menor é sempre o filho do pobre e explorado. Em hipótese alguma uma pessoa é designada por essas mesmas autoridades com terminologias dessa natureza. Elas são incapazes de manifestar a ínfima suspeita de pretender imputar responsabilidades de criminosos a um jovem rico, como costumam fazer com um proletário ou camponês pobre...
Com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente ECA (Lei 8.069/90), muitos profissionais que tinham uma conduta passiva diante das injustiças cometidas contra os filhos dos trabalhadores, se revelaram dignos, não só abolindo de seus pronunciamentos designações pejorativas, como resistiram à tendência majoritária de estabelecer práticas punitivas terríveis voltadas contra as crianças e jovens do povo.
— Isso foi importante, porque a expressão menor era usada especificamente para a camada pobre. Eu me lembro de ter lido uma vez, no jornal, a manchete: "Menor agride adolescente na porta da escola — diz Gladys Peccequillo.
Porém, é claro, muitas autoridades continuaram desrespeitando assintosamente o tratamento exigido às crianças e à juventude cujos pais são trabalhadores, porque insistem em ignorar, por completo, o papel da infância e da juventude de uma maneira geral.
E o modelo Febem é, apenas, um dos frutos desta concepção.
Houve algum progresso. Cristina Lazzarotto lembra que antes do ECA, 80 a 90% das crianças e dos jovens internados nas Febens não eram autores, de fato, de ações definidas como crimes. Bastava a situação de pobreza para que se pudesse decretar a internação, sem processo algum. Mas é consenso entre os operadores da área que "o velho dogma menorista convive com a doutrina do ECA", como diz Carmen. Um de seus principais resquícios é a fixação prisional, em detrimento de outras medidas previstas no ECA.
— Para cada adolescente que tem aplicada a medida de semi-liberdade temos 8 que recebem a medida de internação — conclui a professora.
Paralelamente, ocorre a distorção das outras medidas sócio-educativas previstas no ECA. Gladys Peccequillo denuncia que em São Paulo foram terceirizados todos os programas em meio aberto (semi-liberdade e liberdade assistida), inclusive através de convênios com empresas que servem-se do trabalho dos adolescentes a baixo custo. A criminalização velada da juventude pobre serve, assim, como mecanismo de rebaixamento dos preços no mercado de trabalho. Como na Revolução Industrial.

40 títulos e resumos de bons filmes sobre lutas operarias, sindicalismo, greves, revoluções, movimentos populares, lutas e direitos sociais, direitos humanos

Disponibilizo, aqui, 40 títulos e resumos de bons filmes sobre lutas operarias, sindicalismo, greves, revoluções, movimentos populares, lutas e direitos sociais, direitos humanos, façam bom proveito, para suas aulas, estudos, cursos de formação, palestras, seminários, congressos, pesquisas, ou para seu lazer e ampliação da cultura política e social. Bom dia a todos e todas. Helder Molina.
Germinal:
O filme germinal caracteriza perfeitamente o processo de produção do trabalho do modelo capitalista, a expansão do chamado capital, mostrando assim de uma forma bem clara os opostos entre as necessidades humanas e as materiais. O filme se passa na França do século XIX e transmite muito bem aquele determinado momento histórico e seu contexto social, econômico e político e é claro cultural e para obtermos uma análise satisfatória se torna necessário o conhecimento dos antecedentes da revolução industrial presentes nele.o filme é baseado no romance de Émile Édouard Charles Antoine Zola.
Daens, um Grito de Justiça
No final do século XIX, numa pequena cidade operária da Bélgica, um grupo de operários de uma fábrica de tecidos vive em péssimas condições de trabalho. crianças exerciam tarefas de adulto, o que resultava num grande número de acidentes de trabalho e mortes. o padre Daens chega àquela comunidade e, diante dos fatos, começa a semear a idéia de justiça nos trabalhadores, o que contraria os poderosos e até mesmo a igreja. belo filme, que mostra bem as péssimas condições do trabalho na revolução industrial)
A Classe Operária Vai ao Paraíso
Um funcionário exemplar - Gian Maria Volonté - é adorado pelos patrões e odiado pelos colegas. ele vive entregue aos sonhos de consumo de classe média, alienado aos movimentos operários, até que sofre um acidente, que o faz ver as coisas por outro ângulo e começa um processo de politização. clássico do cinema político, dirigido por Elio Petri. Palma de Ouro em Cannes 1972)
Sindicato de Ladrões
Um sindicato de estivadores, se aproveita da ingenuidade de um ex-boxeador - Marlon Brando - para atrair para a morte um delator das atividades criminosas do chefe do sindicato. clássico de Elia Kazan, ganhador de 8 merecidos Oscars, incluindo filme e ator. mostra a ação da máfia sobre os sindicatos de Nova York)
Eles Não Usam Black-Tie
Um operário, cuja namorada está grávida, decide furar a greve em que sua empresa está envolvida e que é liderada pelo seu pai. sua decisão provoca um conflito familiar. ótimo filme de Leon Hirszman, baseado na peça de Gianfrancesco Guarnieri. ganhou vários prêmios internacionais, incluindo dois em Veneza
O Homem de Ferro
Na Varsóvia dos anos 80, o partido escala um jornalista playboy e alcóolatra para infiltrar-se num grupo de trabalhadores em greve e, e aproximar-se de seu líder, cujo pai fora morto nos protestos de 1970. a intenção é lhes sabotar, mas a dúvida o corrói. mostra em flashbacks a história do nascimento dos sindicatos poloneses e do Solidariedade, incluindo uma ponta de Lach Walesa. o filme de Andrzej Wajda ganhou a Palma de Ouro em Cannes
Pão e Rosas
Duas irmãs mexicanas, trabalham como faxineiras em Los Angeles sem qualquer proteção trabalhista e um patrão abusivo. com a ajuda de um ativista americano, namorado de uma delas, decidem se rebelar, mesmo correndo o risco de serem extraditadas. ótimo filme do britânico Ken Loach
Norma Rae
Sally Field ganhou seu primeiro Oscar e o prêmio de melhor atriz em Cannes, como uma mãe solteira, operária de uma fábrica de tecidos, que mora com os pais, também tecelões. todos trabalham em condições degradantes, até a chegada de um sindicalista, vindo de Nova York e, a princípio hostilizado pelos próprios operários. aos poucos, a luta pela formação de um sindicato ganha adeptos. bom filme de Martin Ritt, um diretor sempre engajado
Como Era Verde o Meu Vale
Durante a depressão dos anos 30, uma família muda-se para uma cidade de mineradores e se empregam na mina de carvão, nas piores condições de segurança possíveis. o dono da mina decide diminuir os salários de todos, o que deflagra uma greve de 22 semanas, que divide a família. dirigido por John Ford, ganhou 5 Oscars, incluindo filme e diretor, derrotando Cidadão Kane, numa das maiores injustiças da história)
Hoffa, um Homem, uma Lenda
Jack Nicholson é o polêmico líder sindical Jimmy Hoffa, cujo misterioso desaparecimento nunca foi esclarecido. o filme relata sua luta para construir o mais influente sindicato dos EUA, sua ligação com a máfia e sua condenação à cadeia, por influência do então ministro Robert Kennedy. dirigido por Danny DeVito e roteiro de David Mamet, não empolga
Peões, Entreatos, de João Moreira Salles. Como O Fio da Memória, os dois filmes são reflexos de um momento político de esperança esquerdista.
Peões
Procura, nos dias da eleição presidencial de 2002, os rostos nas fotos históricas do movimento sindical da década de 1980. O filme também carrega um dos momentos mais emblemáticos da carreira de Coutinho, quando, falando que não quer que seus filhos passem pelo que ele passou, o personagem se deixa interromper pelo silêncio até disparar para o diretor: “O senhor já foi peão?”.
ABC da Greve (1979) – Direção: Leon Hirszman
O filme cobre os acontecimentos na região do ABC paulista, acompanhando a trajetória do movimento de 150 mil metalúrgicos em luta por melhores salários e condições de vida. Sem obter êxito em suas reivindicações, decidem-se pela greve, afrontando o governo militar. Este responde com uma intervenção no sindicato da categoria. Mobilizando numeroso contingente policial, o governo inicia uma grande operação de repressão. Sem espaço para realizar suas assembléias, os trabalhadores são acolhidos pela igreja. Passados 45 dias, patrões e empregados chegam a um acordo. Mas o movimento sindical nunca mais foi o mesmo.
Batismo de Sangue
Apesar do incômodo didatismo do roteiro, o longa é eficiente em contar a história dos frades dominicanos que abriram as portas de seu convento para abrigar o grupo da Aliança Libertadora Nacional (ALN), liderado por Carlos Marighella. Gerando desconfiança, os frades logo passaram a ser alvo da polícia, sofrendo torturas físicas e psicológicas que marcaram a política militar. Bastante cru, o trabalho traz boas atuações do elenco principal e faz um retrato impiedoso do sofrimento gerado pela ditadura.
Linha de Montagem
No documentário, Tapajós registrou o movimento grevista do ABC paulista do final da década de 1970 e começo da de 1980, acompanhando a efervescência do movimento sindical e do nascimento de lideranças que fariam parte da história política do país nas décadas seguintes. Naqueles momentos, a atuação de Luiz Inácio Lula da Silva, o Lula, frente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, nas ruas, nas assembléias e em seguida, avaliando o movimento com certo distanciamento. Está tudo registrado: a organização das greves, a manutenção das famílias dos grevistas sem salários, o apoio de movimentos e da igreja católica, o surgimento de lideranças, a importância da resistência à intervenção no sindicato, a repressão militar, e muito mais. Linha de Montagem foi realizado entre 1978 e 1980 pela produtora Tapiri Cinematográfica. Filmado em 16mm, o filme foi lançado nos cinemas em 1983 e passou por restauração digital (resultou num DVD que foi distribuido nacionalmente em 2008).]
A Greve
Direção: Sergei Eisenstein, Ficção, 82 min. 1924 (clássico do cinema soviético revolucionário sobre greve de trabalhadores).
A classe operária vai ao paraíso
Direção: Elio Petri, Ficção, 126 min., 1971 (filme sobre processo de consciência de classe de operário símbolo da classe média italiana).
A revolução não será televisionada
Direção: Kim Bartley e Donnacha O’Briain, Documentário, 74 min., 2003 (o filme mostra o golpe que tirou o presidente Hugo Chávez do poder por 48 horas, a manipulação dos meios de comunicação na articulação da quebra da legalidade e a forte reação popular que reconduziu o presidente da Venezuela à liderança do país).
ABC da Greve
Direção: Leon Hirszman, Documentário, 75 min., 1979/90 (se passa na região do ABC e acompanha a trajetória de 150.000 metalúrgicos)
Acorda, Raimundo, Acorda!
Direção: Alfredo Alves, Ficção, 1990, 16 minutos (curta que mostra “troca de papéis” entre homem e mulher).
Beijo 2347/78
Direção: Walter Rogério, Ficção (filme sobre trabalhador que é acusado judicialmente por ter beijado uma trabalhadora durante o expediente de trabalho em fábrica).
Candelária aquela que conduz a luz
Direção: Jade Moraes (55 min), Documentário, 2005 (a luta de profissionais do sexo em Sergipe).
Eles não usam black tie
Direção: Leon Hirszman, Ficção, 120 min.m 1981 (filme sobre movimento sindical e conflitos políticos entre pai militante e filho operário).
Ilha das Flores
Direção Jorge Furtado. Documentário, 13 min, 1989 (um tomate é plantado, colhido, vendido e termina no lixo da Ilha das Flores, entre porcos, mulheres e crianças. Documentário que denuncia as desigualdades sociais na região do Rio Grande do Sul.
Invasão ou Cidadania?
Direção: Rede Rua de Comunicação - Alderon Pereira da Costa e Arlindo Pereira Dias. Documentário-reportagem, 32 min, 2000 (sobre luta pela terra e MST)
La terra trema
Direção: Luchino Visconti, Ficção, 180 min., 1947 (aspectos de proletariado de trabalhadores do mar em região pobre da Itália, exploração do trabalho e organização dos trabalhadores)
Ladrões de bicicleta
Direção: Vittorio de Sica, Ficção, 93 min., 1948 (filme clássico do neo-realismo italiano que se passa no período pós II Guerra Mundial, marcado por cidades destruídas e desemprego. Conta o drama de
um homem que tem sua bicicleta roubada, veículo requisitado pelo recém conseguido emprego).
Muito além do cidadão Kane
Simon Hartog, BBC, Documentário, 90 min., 1983 (filme sobre a criação da Rede Globo, seus acordos espúrios e casos de manipulação).
O homem que virou suco
Direção: João Batista de Andrade, Ficção, 90 min., 1980 (filme sobre homem nordestino que vai para o sudeste em busca de emprego e se depara com o preconceito e as dificuldades da cidade grande).
Os carvoeiros
Direção: Nigel Noble, Documentário, 65 min., 1999 (filme sobre trabalho infantil e trabalho semi-escravo em carvoarias localizadas em Minas Gerais, Mato Grosso e Pará)
Tempos Modernos
Direção Charles Chaplin. Ficção, 87 min, 1936 (clássico do cinema mudo sobre o trabalho repetitivo, estafante e alienante de um trabalhador na fábrica)
Terra para Rose
Direção: Tetê Moraes, Documentário, 84 min., 1987 (sobre luta pela terra - Rose é uma agricultora sem-terra que, com outras 1.500 famílias, participou da primeira grande ocupação de uma terra improdutiva, a fazenda Annoni, no Rio Grande do Sul. Fala do início do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra). Rose deu à luz ao primeiro bebê que nasceu no acampamento e foi morta num estranho acidente)

Conjuntura Política e o Papel da Mídia na (des)informação social e política

Hoje, segunda, tarde, eu fiz palestra em Niterói, num seminário com professores(as) da rede de escolas particulares de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Maricá. Representantes de Escolas e Dirigentes Sindicais. O tema era o Papel da Mídia e a (des)informação social e política. Mas na verdade fizemos uma Análise de Conjuntura. Um outro "raio X", ou "ressonância magnética" que mostrou claramente com os(as) militantes e dirigentes de sindicatos estão na defensiva, desarmados de argumentos, perplexos, inseguros, assustados mesmos, com a avalanche de ódio, contra informação, desinformação, calúnias, e a lavagem cerebral que a mídia (nas redes sociais, nas TVs, e nos jornais) faz cotidianamente contra o PT, o governo Dilma, e a CUT. Dirigentes combativos nas lutas específicas, fazem a análise de conjuntura com o mesmo discurso hegemônico da mídia, usam argumentos de nossos inimigos. Faltam informações elementares de História, Política, Economia, Poder, Luta de Classes, Ideologia, Poder, Papel da Mídia. É preciso um trabalho de paciência, para ir desmontando as "verdades" que muitos dos nossos trazem, como suas, mas que são as dos nossos adversários à direita. Percebi a enorme falta que fazem os debates, leitura aprofundada, reuniões de núcleos, estudo crítico, formação ideológica, formação política sistemática, reflexão estratégica. Uma geleia geral na cabeça de nossos ativistas e militantes.

RETOMAR A INICIATIVA POLÍTICA E DISPUTAR HEGEMONIA

Uma avalanche de ódio, contra informação, desinformação, calúnias, e a lavagem cerebral que a mídia (nas redes sociais, nas TVs, e nos jornais) faz cotidianamente contra o PT, o governo Dilma, e a CUT, os sindicatos, os movimentos sociais. E isso impregna até os dirigentes e militantes sindicais. Tenho visto dirigentes combativos nas lutas específicas, fazem a análise de conjuntura com o mesmo discurso hegemônico da mídia, usam argumentos de nossos inimigos. Faltam informações elementares de História, Política, Economia, Poder, Luta de Classes, Ideologia, Poder, Papel da Mídia. É preciso um trabalho de paciência, para ir desmontando as "verdades" que muitos dos nossos trazem, como suas, mas que são as dos nossos adversários à direita. Percebi a enorme falta que fazem os debates, leitura aprofundada, reuniões de núcleos, estudo crítico, formação ideológica, formação política sistemática, reflexão estratégica. Uma geleia geral na cabeça de nossos ativistas e militantes.

COMO FAZEM FALTA OS ESPAÇOS COLETIVOS DE FORMAÇÃO HUMANA E POLÍTICA...

Como fazem falta os espaços permanentes e continuados de formação política, ideológica, e humana, nos movimentos sociais, sindicatos, e partidos de esquerda? Foi um crime contra a consciência dos trabalhadores esse pragmatismo que tomou conta do sindicatos e movimentos sociais. Cresceu o conservadorismo e a despolitização entre os militantes. Perdeu-se a memória, a história, os processos, os fios, os laços. É preciso um trabalho de paciência, para ir desmontando as "verdades" que muitos dos nossos trazem, como suas, mas que são as dos nossos adversários à direita. Percebi a enorme falta que fazem os debates, leitura aprofundada, reuniões de núcleos, estudo crítico, formação ideológica, formação política sistemática, reflexão estratégica. Uma geleia geral na cabeça de nossos ativistas e militantes.