quinta-feira, 14 de maio de 2015

Sindicato, encruzilhadas, e atualidade da luta pelos direitos, democracia, justiça social e emancipação humana

Sindicato, encruzilhadas, e atualidade da luta pelos direitos, democracia, justiça social e emancipação humana

Helder Molina

Há um discurso recorrente de que existe uma crise identidade no movimento sindical, há esse crise?

Se há uma crise? Precisa conceituar crise, para depois verificar se esse conceito, esse papel do sindicato está em crise, ou em mutação. Penso que o movimento sindical para por uma transição, que envolve burocratização, perda da sua identidade, de busca de novas referências, principalmente num mundo onde a informalidade cresce e o velho capitalismo assume novas faces e discursos, de reinado do mercado, do individualismo, da fragmentação, como diz Chico Oliveira, de indeterminação na política.

Assim analisando, o movimento sindical está numa encruzilhada, se dividiu, fragmentou, olha a existência de 7 centrais sindicais, da polarização e intolerância política crescente no interior das correntes, partidos de matrizes socialistas, enfim.
Minha identidade é o movimento sindical, onde tenho referência, militância política, atividade profissional. A década de 1990 em diante foi da ofensiva neoliberal no mundo do trabalho, da ofensiva do desemprego e da destruição dos direitos dos trabalhadores. Meu doutorado é dedicado a tentar entender essa mutação, esse novo sócio-metabolismo, essa nova identidade, e que foi perdida com o arrastão neoliberal

Mutação, fragmentação e encruzilhada

De um lado o esquerdismo se propõe como alternativa, e se isola, buscando sua identidade. Apresenta um discurso fácil, de condenação de todos, de recusa a qualquer coisa que pareça sensato, de combate intestinal aos aliados, agora considerados ex-aliados.De outro os setores neoliberais e o peleguismo reciclado, reinventado, também se constitui com cara própria, ou vários caras de uma mesma identidade.

Tínhamos oito centrais sindicais, agora recentemente houve a fusão da CGT com a SDS e a CAT, dando origem à UGT (União Geral dos Trabalhadores). A própria CUT encontra dificuldades internas, tudo evidencia uma necessidade de repensar seriamente as práticas, repactuar convivências e projetos, recuperar os projetos de classe, de independência e autonomia, que são valores e princípios fundadores do movimento operário e das lutas dos trabalhadores, contra todos os patrões e contra os governos tenham como meta agredir os direitos dos trabalhadores e retirar suas conquistas.

Lutar também contra os hegemonismos, rediscutir eticamente a concepção de democracia, exercer na prática a tolerância, tão fundamental para desenvolver a unidade de classe, tudo isso, se não cuidamos, vai sendo esquecido, abandonado, e viramos burgueses, liberais e capitalistas na prática, embora afirmemos defender o socialismo e a democracia dos trabalhadores. Essa crise está também no método e no discurso.
Nosso discurso já não atrai os trabalhadores, suas direções precisam se renovar, suas práticas estão comprometidas por problemas éticos, e principalmente pela cooptação e adaptação à ideologia neoliberal, e as dificuldades entre ser movimento autônomo e independente e se relacionar com um governo que teve origem nas lutas sociais e dos trabalhadores brasileiros, dos últimos trinta anos

O perigo da adaptação à ideologia neoliberal

As centrais sindicais, como a CUT, tem responsabilidade com as lutas gerais da classe trabalhadora, elaborar propostas, servir de referência, suporte, apoio aos sindicatos nas suas lutas específicas, mas o papel da central é o de organizar as lutas gerais, fazer formação, organizar e articular os movimentos, junto à Central dos Movimentos Sociais, Movimentos dos Sem Tetos, dos desempregados, dos trabalhadores informais, da juventude, das mulheres, dos negros e negras, das questões ecológicas e ambientais, da luta pela saúde, pela educação formal e não formal, tudo isso são lutas da classe trabalhadora, dentro e fora dos sindicatos, e todas são lutas contra o capitalismo.

A importância estratégica da Formação Política, Ideológica, e Humana

Nos sindicatos a formação deve servir de instrumento, ferramenta, para construir novas lideranças, novos militantes. Muitos trabalhadores e trabalhadoras conhecem o sindicato através das assembléias, das mobilizações, das negociações salariais, mas não entendem muito bem o que é o sindicato, de onde veio, para que serve, como se organiza. Muitos só buscam o sindicato na hora das dificuldades, não se sentem pertencentes ao sindicato.
Muitos desses trabalhadores, nas lutas, se aproximam e depois são convidados a ser dirigentes, e não sabem exatamente o que fazer na diretoria, que função desempenhar, como pode ajudar, e os dirigentes mais velhos podem ajudar na participação dos novos dirigentes, mas é papel da formação criar condições dele se formar, com cursos, oficinas, palestras, seminários, enfim.

A formação básica dos dirigentes e militantes sindicais, e os desafios do atual contexto

Novos e antigos dirigentes devem aprofundar o conhecimento sobre as transformações que estão ocorrendo no mundo do trabalho, as mudanças na economia e na política, o papel das novas tecnologia, a questão do desemprego estrutural, da informalidade que cresce, da violência como produto da desigualdade social e da concentração absurda de rendas que existe no mundo hoje, e no Brasil principalmente. Devem buscar entender os problemas relacionados com a gestão dos sindicatos, da administração financeira, das relações com os funcionários, do cotidiano da máquina sindical. Enfrentar a burocratização, cada dia mais presente nos sindicatos.

A formação deve se preocupar com as questões das negociações coletivas, como negociar, fazer exercícios práticos de negociação, discutir as correlações de forças nas negociações, quando avançar, quando recuar, entender o cenário econômico, político, ver quem são nossos aliados, e adversários, nas campanhas salariais.

Enfrentar questões como racismo, machismo, e outros preconceitos na nossa sociedade e nos sindicatos

Não basta criar secretarias de mulheres e de negros ou anti racismo, a verdade é que o movimento sindical é machista, é racista, isso só se supera com combate político, enfrentando cotidianamente as manifestações, posturas, falas e gestos machistas ou preconceituosos nos sindicatos, nas assembléias, nos locais de trabalho. Os cursos, encontros, seminários ajudam a problematizar, discutir e elaborar propostas, mas é preciso que isso se desdobre em outros espaços, como na empresa, na repartição pública, na escola, na família, nas relações informais, na comunidade. Os movimentos anti racistas, anti sexistas e feministas têm crescido em suas influências, muitos sindicatos já criaram secretarias específicas, nos coletivos de mulheres e anti racista sempre tiveram atuações afirmativas, e precisam ser fortalecidos. Os sindicatos devem olhar isso como essencial para construir um projeto de sociedade emancipada, livre, solidária e que respeite a diversidade cultural.

Questões ambientais, da juventude, dos trabalhadores desempregados? Os sindicatos são muito corporativos

A consciência ambiental está crescendo nos movimentos sociais, as lutas pela preservação da água, da natureza, das praias, contra a poluição, os desmatamentos, e destruição da natureza, mas ainda é pouco. O capitalismo é o grande responsável pela destruição da vida, do ecossistema. O capitalismo sobrevive da produção de lucro, da exploração do trabalho humano e da natureza, e para isso ele destrói as forças produtivas. Ele é um destruidor de forças produtivas. Defender a natureza é combater o capitalismo, isso o movimento sindical está começando a compreender.

Desemprego e da informalidade, dos jovens

Temos estudos do DIEESE, do IPEA, do IBGE, enfim, que mostram que mais de 50% da força de trabalho no Brasil estão na informalidade, são trabalhadores desempregados, precarizados, terceirizados, que sobrevivem sem proteção de leis trabalhistas, sem acesso à previdência social, sem garantia de futuro.

E os sindicatos ainda hoje só olham para os trabalhadores de carteira assinada, com emprego formal. Nossos sindicatos ainda estão presos ao passado fordista, isto é, ao mercado de trabalho da grandes corporações, de endereço determinado. Essa massa de trabalhadores estão buscando formas alternativas de viver e de se organizar políticamente, veja a multidão de camelôs, E a maioria dos desempregados são jovens, são mulheres, moram nas periferias, nas favelas, são exércitos de reserva do narcotráfico.

Os sindicatos e a CUT precisam dialogar com a juventude trabalhadora, ouvir suas reivindicações, entender sua linguagem, que se expressam nas artes, na musica, nas manifestações culturais, no movimento estudantil, mas principalmente nos movimentos de rebeldia, presente nas comunidades, nas periferias, como Hip Hop, Funk, grafites, esportes. Se os jovens não vêm ao sindicato é porque nossa prática e nossos discursos lhes são estranhos, corporativos, envelhecidos, burocratizados, carrancudos mesmo. Eles vão buscar refúgio em outros lugares, como drogas, seitas evangélicas, torcidas organizadas, etc.

Basicamente abordarmos a Historia do movimento sindical, como surgiram os sindicatos, as centrais sindicais, as diferentes concepções sindicais de ontem e de hoje, a questão da gestão e do planejamento sindical, cursos de oratória e construção de discursos, negociação coletiva, o que é ser dirigente sindical, e principalmente resgatar a historia do sindicalismo, que foi se perdendo, e as novas gerações desconhecem, parece que não temos passado, e vivem de um presentismo pragmático, corporativo, de negócios salariais e da defesa do emprego a qualquer custo. Abandonamos a luta pelo socialismo, nos conformamos com o capitalismo, e isso, a meu ver, será nossa morte. O sindicato deve lutar contra o capitalismo por uma outra sociedade, um outro Estado.

È possível resgatar? Ou é só desejo?

Num programa de formação, deve existir palestras, debates, cursos, seminários, sobre os temas mais necessários, como a relação do movimento sindical com os governos, a questão da negociação coletiva, das tecnologias, meio ambiente, novas reconfigurações do mundo do trabalho, antiracismo, juventude, movimentos sociais, educação dos trabalhadores, a questão da previdência e dos direitos trabalhistas, saúde do trabalhador, assédio moral, etc.
Exibir filmes, fazer debates e formação utilizando o cinema, o vídeo. Precisamos montar um centro de memória dos sindicatos, a memória sindical está espalhada nos sindicatos, nos arquivos “mortos”, nos depósitos, nos armários, nas caixas, nas casas dos militantes, nos arquivos de ex-dirigentes, enfim. A memória dos sindicatos, com raríssimas exceções, estão amontadas em gavetas, armários, arquivos, quanto muito. Ou nas casas dos militantes e dirigentes, os que guardam vestígios, porque a maioria joga fora.

Recursos humanos, financeiros, e vontade política.

Os sindicatos estão financeiramente, estimular seus diretores a fazerem formação, serem solidários na hora de organizar as atividades, lutamos contra a mídia, os empresários, os fazendeiros, os banqueiros, os patrões públicos e privados, é verdade. Mas também lutamos contra nossa preguiça e acomodação, nosso corporativismo que acha que o sindicato basta por si mesmo, que só vive para fazer campanha salarial, e olhe lá.

Lutamos contra o imediatismo, a movimentismo, e tantos ismos que tornam o sindicatos e a máquina sindical um fim em si mesmo. Sindicato é um instrumento, uma ferramenta da classe, não é posse de nenhuma corrente, nenhum partido, nenhuma religião, nenhum fundamentalismo. Os sindicatos devem estar na frente, encabeçando as lutas, mas também o estudo, a reflexão, a produção do conhecimento, para a mudança social, para construir uma outra sociedade, o capitalismo não nos interesse, o futuro é socialista, acredito.