terça-feira, 17 de novembro de 2015

EDUCAÇÃO E IDEOLOGIA: NEUTRALIDADE? ENGAJAMENTO?


Helder Molina.
Licenciado e Bacharel em História, mestre em Educação, doutor em Políticas Públicas e Formação Humana
• A neutralidade científica é passível de ser encontrada no plano do real?
Não. A neutralidade científica, defendida pela corrente positivista, seria a imparcialidade do trabalho científico, ou seja, o pesquisador não se envolveria emocionalmente com o tema e objeto abordado. Uma racionalidade e um afastamento, sem “contaminações” próprias da relação sujeito-objeto. A realidade não é ordenada e linear, ao contrário, é sinuosa e conflituosa. A relação sujeito-objeto é marcada por contradições, dialoga com interesses econômicos, sociais, políticos e ideológicos. Para existir ciência e conhecimento é necessário selecionar objetos de estudo e esta seleção não é nada imparcial: Escolhe-se a metodologia, os referenciais teóricos, o universo da amostragem, os dados são analisados segundo estes critérios. Nisso tudo há intencionalidade, vontade, subjetividade.
• A neutralidade no ensino propalada por Max Weber é uma teoria datada e superada?
Nas ciências, como na vida, os valores e concepções são disputados como verdades. Axiomas (verdades) são relativas, depende dos referenciais, da concepção de homem e de mundo, do lugar social (classes) na hierarquia de poder, economia. Portanto, verdades são formulações relativas, que devem ser contextualizadas dentro de uma historicidade, levando-se em conta que as idéias são disputadas na vida social concreta. As ideias não são dissociadas (separadas) no mundo concreto, e este mundo concreto é contraditório, conflituoso e em permanente mudança. As teses de Webber foram importantes na afirmação do pensamento científico positivista, liberal, capitalista, portanto. Marcado pela ideologia da ordem, harmonia social, e progresso. Datadas, mas não superadas. Essas concepções permanecem vivas e atuais, mesmo na academia, principalmente nas ciências exatas e biológicas. Como na resposta anterior, não é nenhuma neutralidade no ensino, na pesquisa, nas ciências, na política, na economia, nas relações sociais. Em todos estes campos da vida humana e social tudo é permeado por ideologia, valores de classes sociais, projetos de poder. O conflito, a disputa contra hegemônica, a contradição, a mudança permanente.
• É possível ou mesmo aconselhável uma pedagogia destituída de ideologia?
Toda ciência, portanto a pedagogia como campo das ciências humanas e sociais, é permeada por ideologia, concepções, valores. A educação não é neutra, a sala de aula, a fala dos professores e dos alunos, os textos escolhidos, as ementas definidas, as didáticas e ferramentas escolhidas, os critérios de avaliação, o currículo, a distribuição das disciplinas, os campos de pesquisas, a concepção de curso e de disciplina acadêmico, tudo isso envolve escolhas ideológicas, referenciais políticos, em disputas, no mundo social. Não há nenhuma neutralidade, não é possível nem mesmo aconselhável, e quem diz que é neutro escondendo, ou tentando esconder, que o mundo é contraditório e a realidade é conflituosa. E o mundo não é, está sendo. Os seres humanos não são definitivos e nunca estão prontos, estão em construção, em dialética mudança e superação.
• Paulo Freire e Karl Marx e Antonio Gramsci prosseguem atuais?
Sim, por todos os argumentos elencados acima. A contradição como dialética, as forças sociais e ideológicas em choques na arena das ideias e das ciências, os conflitos entre classes sociais, particularmente no capitalismo, entre explorados X exploradores, opressores X vítimas das opressões, opulência X miséria, concentração X desigualdade e exclusão, e principalmente entre dominantes e dominados, do ponto de vista econômico e político, em qualquer contexto histórico ou espaço em que essas relações se estabeleçam.
• Há engajamento ideológico no curso de pedagogia da UERJ?
Sim, pela conservação, e pela mudança: Há professores e alunos que defendem ambas concepções. De neutralidade científica e despolitização das ciências. Há outros que se posicionam e atuam em sentido contrário, de defesa do engajamento político, social e ideológico, de tomada de posição diante da realidade social, e de ação concreta no mundo, nos movimentos sociais, nas instituições e organizações políticas, na afirmação da autonomia como compromisso de classe, de uma universidade voltada aos interesses da maioria, que são trabalhadores, e de uma ciência comprometida com a mudança social e a transformação no sentido da justiça social, liberdade e igualdade.