Aviso aos transeuntes desatentos ou desinformados
ALIENAÇÃO, FRAGMENTAÇÃO E RETROCESSO SOCIAL E POLÍTICO, EM TEMPOS DE “ZAPZAP” E REDES SOCIAIS
UM TREM PRIVATIZANTE ESTÁ VINDO EM NOSSA DIREÇÃO
Helder Molina
(Educador sindical e popular, assessor de formação política de gestão, historiador,
Mestre em Educação, doutorando em Políticas Públicas, professor da UERJ)
Há uma crescente alienação, principalmente entre os mais jovens, produzida pelo consumismo, individualismo, dos tempos da mercadoria. Um desconhecimento do processo histórico, social, e político. As mídias, incluindo a TV e as redes sociais, fragmentaram as pessoas, com a aparência de que interconectaram-nas umas às outras. Crescem os preconceitos, os indivíduos se movem pelas ondas, pelo disque-me-disque, pela superficialidade, pelo “ouvir dizer”. A fonte de informação é a Globo, as revistas Veja, Época e IstoÉ. Não se lê ou se buscam fontes alternativas de conhecimento.
Neste período de eleições isso fica mais nítido. Dezenas de alunas/os nos procuram, nas redes sociais, ou pessoalmente, perplexos diante de fatos e acontecimentos que desconhecem. Esse terreno de desinformação é fértil para brotar o preconceito, a discriminação. Uma onda homofóbica, contra os movimentos sociais, as organizações que lutam pelos direitos sociais e humanos. A despolitização contribui para a exclusão, a proliferação da alienação.
Muitos estudantes universitários, de cursos das áreas de ciências humanas e educação, desconhecem o mundo ao seu redor, às vezes impossibilitados de fazer uma leitura e posicionamento crítico da realidade. Os textos parecem não ter conexão com a vida concreta. A teoria distanciada da prática cotidiana. Parece que estamos todos numa redoma, numa capsula hermeticamente fechada
A geração que nasceu nos anos 1990 a 2000, por exemplo, não viveu o neoliberalismo, as privatizações, a desindustrialização (no Rio, por exemplo a indústria naval virou um cemitério de navios podres), a globalização e a abertura desenfreada, que inundou nosso “mercado” com produtos eletrônicos (o advento da internet, smartfones, redes sociais, facebook, etc, contribuiu para que “tudo que é solido se desmanche no ar”, como dizia Marx) o esvaziamento do papel do Estado, os “choques de gestão” como gosta de dizer o playboy do Leblon, que governou Minas Gerais, e que agora é candidato a presidente (de quem estou falando), a flexibilização dos direitos trabalhistas, a mercantilização (transforma tudo em mercadoria) da educação pública, da saúde (proliferaram-se os planos de saúde, de todos os preços, e as escolas privadas, principalmente superiores.
Me assusta o “apagador de memória” e o “liquidificador de informações”, que nossa juventude, e mesmo os mais velhos, estão submetidos. A mídia produz uma blindagem, um escudo, que nos impede de ver a realidade econômica, social e política. A verdade é o que a TV diz, o Jornal Nacional funciona como um oráculo, onde todos se ajoelham e juram fidelidade. Tudo isso é ideologia, a serviço de um projeto de dominação de longo prazo. O grande capital financeiro internacional, as grandes empresas transnacionais, a mídia, o pensamento autoritário, racista, homofóbico, a meritocracia (cada um vence na vida pelos seus méritos, buscam esvaziar cada dia mais o papel das políticas sociais e proteção dos direitos dos mais pobres. O mercado, o lucro, é a religião do capitalismo.
Vejam os resultados das eleições, onde os que defendem a pena de morte, a criminalização dos movimentos sociais, a redução do papel do Estado, foram os grandes vencedores. Falar em neoliberalismo, que é isso? A nova geração não faz conexão, com exceções, claro. FHC é um completo desconhecido, ou já foi esquecido, a sua nefasta herança de destruição dos empregos, políticas sociais, direitos, já foi arquivada na memória, e devidamente apagada de nosso presente. Chega a ser estranho falar dessas questões, tal o anestesiamento que amordaça a geração zapzap e facebook. Tudo que é sólido se desmancha no ar, é o que querem nos fazer crer.
Os sindicatos e movimento sociais populares ficam fragilizados com essa ofensiva do mercado. Um retrocesso enorme poderá nos atropelar, feito um trem desgovernado, mas as pessoas não se dão conta. Podem acordar depois que o trem descarrilhado nos atropelar, mais ai já será tarde. Um poderoso bloco histórico seu construiu nesta conjuntura para tomar de volta o Estado, e esse trem atropelador tem, e pode, ser freado. Só a luta social muda da vida, são a organização coletiva e a luta traz conquistas.
Nos últimos 30 anos, a partir das lutas dos movimentos sociais organizados, e dos setores democráticas da sociedade brasileira. Superamos a ditadura militar e o Estado autoritário, colocamos na agenda política e sócia econômica as reivindicações e concepções dos (as) trabalhadores (as) sobre Estado, políticas públicas, direitos sociais, participação e cidadania.
Nos anos 80, no processo de transição da ditadura para o Estado democrático de direito, os movimentos sociais e suas organizações retomaram a iniciativa política, não só de denúncia e resistência, mas de elaboração e proposição de alternativas. Os (as) trabalhadores (as) ocuparam a cena política e, como produto desses protagonizamos abriram-se os espaços de participação institucional e política na esfera pública,
Portanto, a democracia que se institucionalizou no Brasil, mesmo com todas as dificuldades, lentidão, avanços e recuos, é uma conquista política da classe trabalhadora e do povo. Contra a vontade das classes dominantes, principalmente quanto estas tinham a completa hegemonia (dominância) do aparelho do Estado (Seja união, estados ou municípios).
No início dos anos 90, e por toda a década, sofremos um profundo e organizado ataque das políticas neoliberais, de privatizações das políticas públicas, desmonte do poder e da política, dos orçamentos e recursos destinados aos setores mais pobres da sociedade, de Estado mínimo e mercado máximo, desregulamentação dos direitos trabalhistas, crescimento das terceirizações e das precarizações das relações de trabalho, desemprego, abandono da saúde e educação públicas, crescimento do espaço privado, individualismo, da idéia de cada um por si, da propaganda, da mercadoria, do consumo, e da agressiva tentativa de esvaziamento dos espaços de participação pública, dos movimentos sociais, dos sindicatos. Os movimentos sociais resistiram, mas a verdade é que aquele vendaval neoliberal que varreu o Brasil, a America Latina e o mundo, nos deixou na defensiva, na resistência, e nas respostas fragmentadas e sem um projeto ou alternativa que dessa unidade e força às diversas lutas dos movimentos sociais.
Nos últimos anos, mesmo ainda sofrendo os estragos provocados pelas políticas de mercado, de privatização e de flexibilização das políticas públicas, dominantes na década de 1990 e inicio dos anos 2000, os movimentos sociais e suar organizações resistiram e combateram na busca da participação política na vida social, de mudanças nas prioridades econômicas, no resgate do papel do Estado e do poder público, na consolidação de canais de interlocução e proposição de projetos e alternativas, na distribuição da renda, na discussão coletiva dos orçamentos públicos, enfim, de institucionalização da democracia, visando melhorar a vida da maioria da população.
A nosso ver essas rupturas e mudanças econômicas, sociais e políticas não se darão num só golpe, num ataque único e definitivo, como em certos processos revolucionários ao longo da história. Entendemos que a mudança se dará num longo processo de acúmulo de forças e de espaços conquistados, de disputas contra a hegemonia dos empresários, latifundiários e banqueiros, e seus interesses, no Estado e na sociedade. Portanto, têm que ser produto de um processo combinado de lutas, mobilizações e pressões sociais coletivas, dos trabalhadores e suas organizações políticas, dos movimentos sociais diversificados, e de avanços e conquistas dos espaços institucionais, sejam parlamentos, prefeituras, governos estaduais e federal.
Não é possível mudar o mundo sem mudar o poder.
Defender a autonomia dos movimentos sociais significa dotá-los de capacidade política (empedrar) para disputar os espaços da luta social direta, combinada com as lutas institucionais. Ambas são lutas políticas. Portanto, os trabalhadores e as trabalhadores devem participar ativamente da política, pois a política que interessa à classe trabalhadora só poderá ser desenvolvida e conquistada pelas organizações (aqui incluídos os partidos políticos) que estão vinculados aos interesses e lutas concretas da classe.
Mais do que nunca devemos participar da política, a luta sindical tem profundos limites, pois está presa às reivindicações corporativas, econômico-salariais. Na disputa política mais geral, pelos direitos dos (as) trabalhadores (as) são necessárias, fundamentais e não podem ser abandonadas. Mas devem combinar com outras lutas e reivindicações, que são obrigações do Estado (poder público).
Pense e se mexa. Que acha disso? Isso sim significa República, "res" (coisa) pública, consciência política, agir coletivamente, responder à importância e a centralidade de participação das bases, construir o poder popular de baixo para cima, romper com as velhas estruturas apodrecidas do Estado, do poder público, da política e da economia. Enfim, no concreto significa erguer novas estruturas sociais, consolidando a distribuição da renda, da participação, da democracia.
Rio de Janeiro, Outubro de 2014.
Helder Molina
Doutor em Políticas Públicas e Formação Humana (UERJ); Mestre em Educação (UFF); Licenciado e Bacharel em História (UFF). Trabalho com Assessoria Sindical; Formação Política; Produção de Conteúdos; Planejamento; Gestão; Elaboração e Produção de Cadernos de Formação, Apostilas, Conteúdos Didáticos; Produção e Execução de Cursos, Seminários, Palestras, Aulas, Oficinas; Produção de Projetos Sindicais, professorheldermolina@gmail.com - 21 997694933,Facebook: Helder Molina Molina